Turismo Militar, o lado bom da guerra
Ser o país da Europa com as fronteiras mais antigas dá direito a muita coisa. Até a ter uma categoria especial de turismo, o militar
Houve um tempo em que havia um turismo. Bastava escolher um destino, pegar na mala e no guia, e zarpar. À chegada, via-se tudo o que o local tinha para oferecer, ia-se à praia ou ao museu, jantava-se fora e voltava-se para casa, cheio de memórias e polaroids. Também aqui o mundo mudou.
Com a pressão económica e a necessidade de reinventar negócios, o turismo desdobrou-se em ‘turismos’. E cada nação tira partido do que o tempo e o engenho dos homens lhe cedeu. Hoje em dia existem, sem qualquer tipo de eufemismo, variadíssimos tipos de turismos, sempre em função das especializações naturais de um pais ou região. Por exemplo, o religioso, de que Fátima é um bom exemplo; ou o gastronómico, que por vezes extrapola o que já existe e que se recomenda, e inventa junções de dois ou mais produtos regionais famosos, de que o pastel de bacalhau recheado com queijo da serra é um exemplo assaz infeliz.
Castelo de Guimarães, dita cidade-berço de Portugal
Um nicho que tem tudo o que precisa para dar certo em Portugal é o turismo militar. A idade e o sucesso de uma nação podem medir-se pelo número de castelos, fortalezas e sítios históricos ligados à sua defesa; Portugal nasceu da guerra, quando no final do século XI Afonso VI ofereceu ao Conde D. Henrique o Condado Portucalense e a mão da filha Teresa, em troca da ajuda que o borgonhês lhe prestou no combate ao Império Muçulmano.
Arquitetura castreja da Cividade de Terroso, Póvoa de Varzim
O espólio arquitectónico e monumental que são o cerne da oferta do turismo militar português tem raízes num passado ainda mais distante que o décimo primeiro século: muitas da construções militares que vemos hoje têm por base (por vezes ainda bem visível) outras anteriores, de origem árabe. E se concordarmos que as construções da civilização castreja são antes do mais povoados fortificados, desenhados para a defesa de bens e pessoas, podemos recuar a linha temporal dos monumentos de carácter militar bem para trás no passado, para a Idade do Bronze, como é exemplo a Cividade de Terroso, na Póvoa do Varzim, datada aproximadamente de 900 a.C., ainda plena Pré-História.
Museu Militar de Lisboa, com parte da coleção mais completa de artilharia do mundo
Existem museus que concentram num só espaço artefactos militares: em Lisboa, frente à Estação de Santa Apolónia, pode visitar o Museu Militar de Lisboa, o mais antigo da cidade. Para alem das coleções de carácter militar, especialmente a de artilharia, considerada a mais completa do mundo, vale a visita pelo espaço apalaçado, de grande beleza ornamental em talha, azulejaria e pintura.
Também o Porto tem o seu Museu Militar, com uma Sala de Miniaturas, onde os ‘soldadinhos’ mostram como mudaram as modas militares desde a antiguidade até aos nossos dias. No Parque podem ser vistas peças de artilharia usadas pelo exército português desde o séc. XVI até ao 3º quartel do séc. XX.
O Forte da Graça, em Elvas, acabado de restaurar, parte da candidatura conjunta Fortalezas da Raia a Património Mundial da UNESCO.
Elvas tem recentemente recriado o seu Museu Militar, com várias coleções disponíveis para visita. Mas é aqui, em Elvas, que o turismo militar extrapola a visita costumeira aos museus, como a conhecemos até agora; a nova tendência turística abarca um maior e mais largo conhecimento, fora das salas fechadas com vitrinas de artefactos. Restaurado no final de 2015, o Forte da Graça é bom exemplo desta nova polivalência que os monumentos militares agora oferecem, como espaços onde é realmente sentido o modo de vida do guerreiro antigo, e onde os visitantes acabam por ser eles uma espécie de figurinhas de vitrinas, inseridas num contexto histórico real.
Prova da relevância crescente do turismo militar é a recente candidatura conjunta, a única nacional em série, das Fortalezas da Raia a Património Mundial da UNESCO. Engloba esta de Elvas e as vizinhas construções de Almeida, Marvão e Valença, como exemplo de linha defensiva de uma Nação e de um Estado.
O Claustro Real do Mosteiro da Batalha
Para acabar pomos a cereja no topo do bolo, neste caso, a bala na boca do canhão, e dizemos-lhe como o Mosteiro da Batalha é imperdível.
De uma só vez, o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, vulgo da Batalha, abarca três categorias de turismo, o religioso, o artístico – é afinal um mosteiro exemplar do gótico nacional – e o militar.
Foi construído como agradecimento a Deus pelo rei D. João I por ter ganho, com a ajuda divina, a Batalha de Aljubarrota, no quente agosto de 1385. Esta batalha assegurou ao rei o trono, e solidificou a independência de Portugal. A construção estendeu-se por 150 anos, através de várias fases, o que justifica a existência de várias soluções artísticas, predominantemente góticas e manuelinas com apontamentos renascentistas.
A 9 de abril de 1921 foram conduzidos para o Mosteiro da Batalha os corpos de Dois Soldados Desconhecidos, vindos da Flandres e da África Portuguesa, representando os gloriosos mortos das expedições enviadas para esses teatros de operações, e simbolizando o sacrifício heróico do Povo Português. O Túmulo do Soldado Desconhecido foi colocado sob a arrojada abóbada da Casa do Capítulo e é regularmente cenário de visitas patrióticas, como um santuário votivo da Alma Nacional.
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