Ilha de São Jorge: por onde o santo perdeu a capa
Não resistimos, e depois do Faial e do Pico, rumámos à ilha de São Jorge nos Açores
Por João Galvão
É verdade que lhe tínhamos dito que 72 horas no Faial e no Pico eram o aperitivo perfeito para conhecer as ilhas, mas, se puder, junte-lhes mais 42 para dar um salto a esta ilha magnífica, uma fina crista que se ergue verde no meio do Atlântico.
Tem 53 km de comprimento por apenas 8 de largura e mais de 1000 metros de altura (vê? é mesmo uma crista), também ela vulcânica como o restante arquipélago. A viagem faz-se com o mesmo ferry que liga o Faial ao Pico, São Jorge é apenas a paragem a seguir.
Para realmente sentir a ilha plenamente, tem que fazer um trilho. Não lhe pedimos que percorra os 12, 17 ou 22 km que lhe dariam realmente a dimensão geográfica/botânica/animal do sítio, mas garantimos que os 4 km que separam a Fajã de Cubres da Fajã do Santo Cristo são bem possíveis, até para quem fuma sedentariamente.
Vale a pena abrir um parêntesis para explicar tanto a continentais como a estrangeiros que diabo é esta palavra, Fajã. As Fajãs são lugares, na sua maioria, parcamente habitados situados em pequenas extensões de terreno plano, junto à costa, onde o tempo, o mar e a intempérie tiveram tempo de desbastar a costa e aplaná-la. Numa ilha quase toda a pique, estas áreas são aproveitadas para a agricultura e habitação, enquanto que os planaltos das serras são cedidos ás vacas, muitas, tantas nesta ilha como nas outras, de cujo o leite se faz, para mim, o melhor queijo do mundo.
Pode levar no ferry o seu próprio carro – o preço varia em função da ilha de onde vier – ou alugue um nas Velas, a vila do porto. Antes de o deixar na de Cubres e de meter pés ao caminho tenha consciência que no destino não há comércio algum, exceto uma pequena mas pitoresca taberna, com belo alpendre virado ao mar. Nem comércio nem eletricidade: na casa onde pernoitámos, no quarto com a mais bela vista onde fiquei até hoje, foi ligado um gerador entre as 9h00 e as 0h00. Tudo o que necessitar tem levar às costas, ou usar moto-quatro com motorista, uma espécie de uber das ilhas. Mas não tem tanta piada quanto trilhar a pé, e os trilhos estão abertos às motos apenas em curtos períodos ao longo do dia. Por isso, seja frugal e racione.
A caminhada demora, calmamente, cerca de hora e meia a duas horas. De um lado, a natureza quase intacta, escorrendo densa e verde do alto dos mais de mil metros de altura da ilha/cordilheira e do outro, o oceano vasto a perder de vista, do azul vivo à cor de chumbo em quinze minutos, tal é a rapidez da variação climatérica de São Jorge. E se chover não se preocupe, na maior parte das vezes acontece durante um minuto ou dois e até refresca a testa, que trilhar é duro.
No final há uma casa, mar e uma lagoa, e ninguém precisa de mais para ser feliz. Passe no Borges, a taberna da Fajã, e fale com o dono, seja para jantar lapas, seja para encontrar poiso. Os sítios onde ficar (como tudo o resto aliás) não são muitos, por isso talvez seja melhor marcar com alguma antecedência, dependendo da época do ano.
Durma bem - sem ruído de carros e só com marulhar do oceano será fácil - o regresso será pelo mesmo trilho. Reserve algum tempo no dia seguinte para visitar a Fajã do Ouvidor, onde encontrará a maravilhosa piscina natural de Simão Dias onde a escarpa negra vulcânica toma formas geológicas interessantíssimas, numa espécie de meia abóboda em colunata. É como mergulhar numa catedral gótica inundada na companhia de Ozzie Osborne and family ao som de hinos de rock sinfónico.
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